sexta-feira, 3 de agosto de 2018

O Pecado Capital Parte 04

                                    EPISÓDIO 4 (OCASO)

     Todas as imagens agora são perfeitas. Lembrando de tudo vou afirmando com certeza absoluta que estamos mortos. Durante essa noite, recebi toda a carga de informações nas sensações corporais. Coisas que nem sequer imaginaria que pudessem um dia ter acontecido comigo. Eu sei que eu senti amor, mas a luz do sol se esvaiu depressa quando a noite caiu em sua habilidade geométrica. Isso pareceu uma coisa tão caprichosa que por uma fração de segundo me senti tomada pelas leis que se formaram dentro de mim e que conduziram adiante nesse espírito inelutável. Mas logo tudo mudou, sob essa sombra seguiram-se pilhas de cadáveres e zumbis lançados pelo mundo afora que logo teriam um pensamento igual ao meu. Cada um em seu pequeno poço nojento e pegajoso me fazendo companhia no cosmos da energia invisível.  
     Muitas vezes pode parecer a um desavisado que vejo tudo por um aspecto sombrio. Eu nem me importo mais com a impressão dos outros. O que importa é que as figuras estranhas espreitando o meu estado espectral, ainda não notaram que estou contida em lembranças entrecortadas pelo prazer sádico desse momento. E que estou completamente tomada por um tipo de  vontade descoordenada que nunca termina. Sei que de vez em quando parece que sinto um tipo de amor sofrido e nostálgico com a terra começando a girar em seu eixo supremo. Enquanto todo o imenso esgoto das imagens revoltantes continua gorgolando furiosamente pela geografia dos continentes imaginários que criei, onde tudo é a pura essência sólida daquilo que sempre se torna depois de ingerido e digerido, mas a tampa está bem fechada, as portas aferrolhadas e tudo nessa minha vida se tornou apenas uma poesia débil. Essa vida que falo continua sendo construída sobre um poço vazio onde fervilham vermes que devoram minha racionalidade. Parece que assim nasci e assim me criei. Aqui, onde uma raiva cega devora o meu cadáver na cama da eternidade em que ele está deitado sob o lençol, há coisas que não posso compreender, por isso, ainda de pé e enrolada no cobertor olho de novo ao redor com olhos mansos. Só assim percebo que tudo aquilo que parece estranhamente sufocante enobrece a alma com esperança. Esse é o lugar e a pessoa ao qual pertenço, não há mais dúvida. Mas quando me entrego me sinto como se fosse um cadáver sendo alimentado por lembranças soltas que cutucam fundo. Uma alma sem qualquer noção de tempo e espaço. 
      Os meus pensamentos continuam se espalhando do quarto para o  mundo, enquanto isso, algumas ações fogem de mim  e eu permaneço completamente ausente de tudo. Por um motivo qualquer, sinto que não há mais nada a esperar que possa mudar essa situação. Durante anos, dentro da realidade de sonhos, vivi a vida esperando que algo acontecesse, que algo alterasse o meu tempo de espera e o meu lugar dentro dele. Mas, na mais absoluta desesperança fiquei com tudo de ruim que tomou conta de mim, e o que restou foi o instrumento para destruir ilusões. O que sobrou foi aquilo que  me tornei. Queria poder alterar um único elemento dessa natureza. Algo que fundamentalmente mudasse toda a história que ainda não foi contada. Sem saber dessa sina cheguei até os extremos de limites imagináveis para preservar as migalhas do que ficou. Mas minha resistência chegou em seu ápice, então tive que saltar na tentativa de encontrar Deus do outro lado. Mas o meu salto não foi suficientemente grande. Abandonei um mundo e me enjaulei em outro intermediário, só soube disso quando me dei conta que emocional e espiritualmente estava morta. 
        O mundo que abandonei ressurgiu. Um mundo de rivalidades e inveja onde as almas famintas sobrevivem encantadas por bajulação e orgulho. Elas gostam disso. Isso as conserva como são: perversas e sem humildade. Essas almas que me perseguem se perdem numa futilidade esmagadora me fazendo crer  que o sexo que pratico vale muito mais que a lealdade que deveria ser oferecida. Meu Deus! Como odeio essa situação! Quanto mais importância se dá a isso, maior é a perseguição no meu pensamento. Há algo tão perverso em mim. Alguma coisa como uma superficialidade intelectual que rumina um tipo de tortura psicológica avançada, algo que destrói todo e qualquer convívio em qualquer tipo de ambiente. Gostaria de não ser tão infernalmente crítica para comigo mesma. Imaginando isso é que me fortaleço no dever de continuar, ainda que saiba que ele não dá a menor importância a tudo que vem acontecendo e se esconde protegido por suas falas descaradas. Portanto, faço e continuarei fazendo reflexão de todas as malditas coisas que ele me fez. E como fez! Isso de uma forma absolutamente original e perfeita, muito bem calcada na maldade. 
      Sei que quando tomo conhecimento desses pensamentos fico mais desdenhosa com tudo que nunca foi revelado abertamente e agora está aqui tão presente em mim. Porém, hoje tudo se inverteu daquilo que foi antes. Sou eu a tirana, aquela que, sem o menor sentimento de culpa ou constrangimento, o fará sofrer. O que há de errado em mim por ser assim num instante? Todos os elementos da nossa união foram expostos. E poxa vida, como éramos íntimos! Como éramos confidentes e cúmplices de revelações! Éramos como duas engrenagens cheias de dentes onde uma corrente sincronizava o movimento, mas de vez em quando essa corrente escapava e era o caos. Nenhum toque de mão divina ou humana poderia conserta-la. Só o tempo poderia fazer com destreza. E quando recolocada no lugar tudo voltava a ser exatamente igual ao que era antes. E dia após dia nós poderíamos dormir e acordar tendo a certeza que a engrenagem estaria azeitada, juntamente com todos elementos inalterados que não faziam parte do mecanismo de aproximação, mas eram fundamentais. As explosões, colisões e catástrofes acabavam sempre controladas pelo sexo. Essa era a chave de tudo. Sexo sem parar, de manhã, de tarde e de noite. Sexo com vírgula e ponto e vírgula. Sexo com café da manhã, almoço e lanche da tarde. Sexo na claridade e na escuridão. Sexo sob aquela mesa com pernas de ferro ou sobre a grama fria de uma noite de primavera. E depois vinha um imenso vazio, mesmo que tudo ainda se mantivesse numa aura romântica de sombria satisfação. Lembrando disso começo a pensar se faria alguma diferença caso não tivesse escolhido o caminho que trilhei, ou se faria alguma diferença ter essa criatura irrequieta ao meu lado por mais algum tempo. Ele sabe muito bem que eu o conheci profundamente, talvez melhor que ele mesmo. Quando eu dizia: “Venha cá e me beije”! Ele me beijava e eu sentia no seu carinho a súplica do desejo. Então eu o apertava e implorava aquele pouquinho de amor. Por isso que agora, quando sinto que foi desprezado e ficou com a imagem despedaçada, é que imagino o sofrimento e a miséria interior que vive por causa da outra. Talvez hoje já não lhe agrade mais humilhar com palavras de superioridade. Quem sabe os seus métodos mudem por que o milagre da natureza se expressa no efeito de sobrevivência e amplitude. Todo o meu Ser respira o seu perfume. É impossível continuar sem sentir a elevação da memória dos cheiros, dos toques e dos momentos inesquecíveis de aconchego. Toda pessoa possui o dom de dissolver sua figura, perpetuando a sua própria imagem por detrás de tantas minúcias que vão do orgasmo ao caos. Muitas vezes ouvi longos recitais dos musicais fantasmagóricos perambulando por dentro da cabeça, não era só música, eram descobertas em cada passagem por reinos intermediários que se revelavam na imaginação. Eu via um mundo que ia adoecendo e morrendo aos poucos, tal qual a eterna criação do cosmos que depois de pronto continuou em constante mutação e se deteriorando passo a passo. Assim, embora instintivamente, o meu intimo me dissesse para parar a caminhada à toa, isso em busca do amor sem amor, eu insistia em marchar adiante, uma marcha batida e determinada. 
     Meus pensamentos confortadores me trazem de volta a tudo isso. É realmente fascinante ser apanhada desse jeito. É uma onda de nostalgia quase anacrônica e fora de propósito. Onde toda confusão, desordem, pensamentos devastadores, vibrações malignas e sentimentos ilusórios carecem de significação plausível. Sei que o fato de parecer estúpida me desalenta um pouco. Mas no estágio em que me encontro existe uma identidade básica e indissociável que se estende pelas garras do tempo. Todo o contorno dado a essa situação se norteia por motivos específicos que foram criados por palavras, olhares, atitudes, desinteresses e traições. Tudo foi baseado na falta de compromisso com a verdade, regras e códigos de conduta. Agora sei que estou atuando através de uma demanda concreta que partiu de atos agressivos, também concretos, que sofri. Mesmo que tudo esteja ocorrendo de uma forma totalmente simbólica e planejada, o que também pode ser visto por outro ângulo é que tenho que seguir em frente.  Durante um período de tempo imprevisível tudo o que foi feito a mim será o motivador desse jogo dramático, um jogo que culminará no cumprimento daquilo a que me incumbi.  Estou ficando enojada com esse destino cruel ao qual me submeti. Eu quero ouvir música, escrever tudo num livro ou sonhar com as ambições do passado. Por quê essa existência não me permite nada disso imediatamente? Que vantagem há em vaguear de lugar em lugar e fazer novos planos? Por quê não fui destinada ao mesmo caminho de todas as outras mulheres felizes e radiantes? A minha origem está se perdendo na obscuridade de um Ser vagante que nunca consegue se sentir no comando. Eu queria tanto voltar ao mundo comum da vida que sonhei. Queria tanto sair de onde o vento gelado sopra e tudo se torna obscuro e deserto no pensamento. Eu queria a transição; viver o sonho que ainda não conheço e me dissolver no ar para desaparecer definitivamente. 

3 comentários:

  1. Caro amigo! Há anos atrás posso lhe dizer me vivi um passado. Hoje não, hoje vivo o presente sempre. Sua personagem viveu muitas transições e a entendo perfeitamente. A procura de alguem em sua vida, talvez porque a té a sociedade nos cobra por isso. O comentário sempre ocorre "Nossa você esta tão sozinha? " e eu repondo não estou comigo mesma. Estou ótima. Hoje posso escolher com quem quero companhia, bater um papo,ouvir. O amor? quem sabe nesse meu caminho vai acontecer? E quando acontecer vai ser maravilhoso. Bora viver sem cobranças, principalmete pela sociedade...viver a minha vida. Abraços

    ResponderExcluir
  2. Patricia Ramos Sodero3 de setembro de 2018 às 21:58

    Boa noite,Sr.Autor!Td bem?Neste capítulo,vejo uma mulher que realmente precisa de tratamento psicológico urgente.Ela não se liberta do passado de forma alguma.E fica claro que a maior culpada foi ela,em ter perdido o grande amor de sua vida.Talvez passe por tudo isso hoje,por ter envolvido outros homens,se aproveitando de alguma maneira deles,os fazendo sofrer.Em tudo aquilo que se planta,existe a colheita.A maneira com a qual escreve,Sr.Autor,nos faz refletir o quanto devemos pensar em nossas ações antes de qualquer atitude.
    Parabéns e vamos aguardar os acontecimentos.Bjs...

    ResponderExcluir
  3. Então Sr.autor, está mais do que na hora deste mulher esquecer o passado ou pelo menos deixa -lo lá e virar a página e viver o presente porque não acredito em destino,nos o fazemos,nos o determinamos como vai ser,só depende de nossas atitudes...

    ResponderExcluir

Bruxas Existem!

      Quem visse de perto aquela mulher, com os seus  anos de estrada, dificilmente imaginaria que em outras épocas, - tempo de menos esclar...